Modificação de tecido para fortalecer os corações subdesenvolvidos
As células coletadas de uma pequena porção de pele poderiam se transformar em músculo cardíaco e reparar um defeito cardíaco congênito raro? Esta é uma questão científica que o Dr. Timothy Nelson (Ph.D.) e os seus colaboradores esperam responder para as pessoas que nasceram com a cavidade cardíaca esquerda subdesenvolvida (uma condição rara e complexa conhecida como Síndrome de hipoplasia do coração esquerdo, SHCE).
A descoberta da primeira terapia baseada em célula para reconstruir o tecido do coração para pessoas com SHCE foi fruto de uma pesquisa apaixonada transcorrida ao longo de uma década com o Dr. Nelson, diretor do programa da família Todd e Karen Wanek para Síndrome de hipoplasia do coração esquerdo na Mayo Clinic.
“O problema é que a maioria dos pacientes complexos com um único ventrículo nascidos com defeitos congênitos cardíacos como SHCE eventualmente desenvolverão insuficiência cardíaca. Infelizmente, o transplante cardíaco não é o ideal para essa população de pacientes, uma vez que as crianças com comorbidades complexas não podem ser incluídas, mesmo que não houvesse uma grave escassez de órgãos adequados,” afirma o Dr. Nelson. “A pesquisa da Mayo Clinic possui um papel importante no avanço das descobertas inovadoras para expandir as opções de tratamento de condições cardíacas raras e complexas.”
Remuscularização cardíaca
Aproximadamente 10 mil pessoas nos EUA estão vivendo com SHCE, uma condição que enfraquece severamente o coração. A cirurgia para a reposição das artérias permite que um único ventrículo bombeie sangue para os pulmões e o restante do corpo, mas restaura apenas uma parte da função circulatória. Ainda que os avanços estejam sendo feitos, poucas pessoas com SHCE vivem mais do que 30 anos.
“SHCE é como pegar o motor de um cortador de grama, colocá-lo em um veículo utilitário (SUV) e dirigi-lo até o trabalho a 110 km/h todos os dias,” afirma o Dr. Nelson. “Nossa pesquisa está tentando compreender se podemos converter os corações defeituosos de um motor de 5 HP para um motor de 50 HP. Provavelmente, nunca o transformaremos em um motor de 100 HP, assim como acontece com um coração normal, mas nosso objetivo é tornar o coração maior e mais forte.”
Tecnologias atualmente em estudo clínico, como o sangue do cordão umbilical e medula óssea, denominados pelo Dr. Nelson de “fertilizantes”, podem ser injetados no músculo do coração durante as cirurgias planejadas e podem ser úteis para preservar e proteger o músculo cardíaco. No final das contas, isso tem um valor terapêutico limitado após o início dos sintomas de insuficiência cardíaca.
“A abordagem com os fertilizantes pode estimular o crescimento cardíaco tanto quanto possível. Na maior parte do tempo, isso não é suficiente para nos levar à linha de chegada, uma vez que o fertilizante por si só não é capaz de aumentar e fortalecer o coração suficientemente,” afirma o Dr. Nelson.
Em busca de novas opções, a pesquisa da equipe do Dr. Nelson está investigando se o produto cardíaco biomodificado poderia regenerar o próprio tecido cardíaco e desenvolver a parte subdesenvolvida do coração, ou seja, essencialmente remuscularizá-lo.
De uma porção de pele a uma célula cardíaca
A pesquisa na regeneração do tecido cardíaco começa com uma biópsia de uma porção de pele do paciente do tamanho de uma borracha de lápis. As células podem ser extraídas, e então, são reprogramadas para se tornarem células-tronco pluripotentes induzidas, o que equivaleria dizer que houve uma volta no tempo até o momento em que as células foram formadas pela primeira vez no útero. Naquele estado, as células estão se dividindo e são capazes de se transformar em qualquer tipo de célula no corpo. Neste caso, elas estão sendo treinadas para se tornar células cardíacas, conhecidas como cardiomiócitos. Elas se tornam células musculares cardíacas que batem e se contraem.
Trata-se de um processo de nove meses a partir da extração até o escalonamento de centenas de milhões de células que precisariam ser testadas quanto à formação de um novo tecido cardíaco.
“Essas células foram reprogramadas no laboratório e testadas em diversos modelos pré-clínicos nos quais elas foram observadas sendo enxertadas no músculo cardíaco receptor. Então, ocorre crescimento, divisão expansão,” afirma o Dr. Nelson. “Agora, estamos interessados em aprender se esses cardiomiócitos poderiam regenerar o tecido cardíaco em humanos.”
O caminho sinuoso da pesquisa do Dr. Nelson ao longo de uma década o levou a descobrir uma importante conexão. A Administração Federal de Alimentos e Medicamentos nos EUA permitirá que a equipe estude a segurança das células cardíacas modificadas e pluripotentes induzidas em teste de fase 1 na Mayo Clinic para adultos com defeitos cardíacos congênitos.
O Consórcio SHCE, composto por múltiplos hospitais cardiovasculares em toda a América do Norte, foi fundado na Mayo Clinic e fornece uma abordagem de equipe para conduzir estudos em larga escala aos pacientes com doença cardíaca congênita complexa. O consórcio SHCE trabalha conjuntamente para avançar o conhecimento e prática científicos para o tratamento de doenças cardíacas congênitas raras.
Esse importante trabalho (reparar, substituir e restaurar as células, tecidos e órgãos doentes) está associado com a medicina regenerativa. O centro para bioterapias regenerativas da Mayo Clinic apoia a pesquisa da SHCE mediante distribuição e expansão da rede de cientistas e pesquisadores que utilizam essas ferramentas no Biotrust de medicina regenerativa.
Esse marco para a pesquisa do SHCE na Mayo tornou-se possível, em parte, graças à colaboração com a Mayo Clinic Ventures para licenciar a tecnologia para uma organização sem fins lucrativos que patrocinará o ensaio clínico. A organização sem fins lucrativos, HeartWorks, assim como sua equipe de 20 pessoas, trabalharam com o programa da Mayo Clinic para SHCE com o propósito de colaborar no desenvolvimento da tecnologia que será testada. A pesquisa também recebe apoio graças à generosidade da família de Todd e Karen Wanek.
Dependendo do resultado do estudo de segurança de fase 1, poderá levar anos para que o tecido cardíaco modificado seja aprovado para uso no tratamento clínico diário da doença cardíaca congênita.
A pesquisa do Dr. Nelson:
Terapia de células-tronco e doença cardíaca congênita
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